Quem acompanha o noticiário diariamente já deve ter percebido que vem da Ucrânia o
epicentro de uma situação belicosa que vem acirrando os ânimos entre os EUA e a Rússia
nos últimos meses. Mais do que um conflito regional que opõe as duas maiores
potências militares mundiais, a cizânia envolve ainda a OTAN e tem potencial para
estremecer a geopolítica mundial pelos próximos anos, ou até mesmo décadas.
Tudo parte do entendimento pragmático por parte do governo russo, que deriva da
constatação de que as superpotências devem exercer poder de influência em suas
regiões, algo que realmente não está longe de ser a realidade global. No caso da Ucrânia,
e que se estende também à Belarus, a celeuma vem desde antes da ascensão da União
Soviética, quando estes três países formaram a chamada “aliança eslava”, devido assuas
proximidades geográfica, étnica, política e histórica. Com o fim do bloco soviético,
chegou a haver negociações para que os três países fossem integrados em um só, mas
diante das confusões políticas naquele momento, o projeto não avançou.
Voltamos então ao poder de influência das superpotências. A Rússia enxerga, desde o
fim da Guerra Fria, que deve exercer influência direta e até mesmo militar sobre países
asiáticos e do leste europeu, assim como os EUA exercem sua influência sobre o México
e boa parte das América Central e do Sul. Já desde antes dos conflitos na Síria ou
Chechênia, este conceito vem gerando sinais de acirramento das relações entre russos
e estadunidenses. Tentando ampliar sua influência na Ucrânia, principalmente após a
catástrofe nuclear de Chernobyl, a Rússia intensificou as movimentações militares na
fronteira entre os dois países, mas foi o fato do vizinho ser “país parceiro” da OTAN
(aliança militar que inclui EUA, Canadá, França e Alemanha), e a sinalização de que pode
se tornar membro do bloco a qualquer momento, que escalou a situação bélica na
região. Já estão posicionados na fronteira mais de 100 mil soldados russos e estima-se
que, em poucos meses, este número chegue a 175 mil militares, tornando a invasão à
Ucrânia algo possível de acontecer muito em breve.
É quase certo que, caso a ofensiva russa se concretize, os EUA e países europeus
fornecerão equipamentos e armamentos para que os ucranianos possam resistir, mas
não vencer a guerra em si, a um custo humanitário terrível. A estratégia visa arrefecer a
convicção dos generais russos, que acreditam numa conquista rápida de território,
apesar do exército ucraniano ser o terceiro da Europa, atrás apenas da França e da
própria Rússia. E é aí que outras regiões do mundo passam a fazer parte do conflito. Em
retaliação ao que consideram uma intromissão dos EUA na região, a Rússia vem
sinalizando aprofundar relações com Cuba e Venezuela, e o Brasil também está no mapa
de expansão russa. Com boas relações com governos autocratas, como Belarus, Síria,
Turquia e Hungria, o premier Vladimir Putin vem estreitando relações com o governo
Jair Bolsonaro.
Portanto, ao ganhar força com muita rapidez, caso se concretize, o conflito tem o
potencial de forçar o mundo de volta aos tempos da Guerra Fria, encerrada nos anos
1990. Alguns países do mundo passariam então a fazer parte, mesmo que
indiretamente, do conflito. Para nós brasileiros, o momento de eleição, em que
Bolsonaro poderá negociar com Putin, não poderia ser pior em termos de influência.
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