O ensino técnico no Brasil está patinando e o investimento na área não é uma prioridade

Isso é um problema sério que afeta não só os estudantes, mas toda a sociedade

Por Murilo Medeiros

Considerada uma excelente ferramenta para suprir mão de obra qualificada, alavancar a produtivi- dade e gerar empregos, a educação profissional e tecnológica (EPT) ainda patina no Brasil e seu reco- nhecimento está longe de ser alcançado. Dados do orça- mento público brasileiro mostram que os investimentos para a área despencam a cada ano. Por mais que o en- sino técnico profissionalizante esteja presente nos dis- cursos políticos, especialmente durante as campanhas eleitorais, pesquisadores são categóricos ao afirmar que o segmento vem perdendo espaço, nos últimos anos, entre as prioridades do Ministério da Educação (MEC).

Números levantados pelo Itaú Educação e Trabalho, utilizando informações oficiais, mostram que, enquanto o orçamento do MEC cresceu R$ 47,4 bilhões nos últi- mos seis anos, passando de R$ 111,6 bilhões em 2018 para R$ 159 bilhões em 2023, o valor destinado para a educação profissional subiu apenas R$ 2,4 bilhões no mesmo período. Em 2018, a EPT recebia 11% da fatia total de recursos destinados à educação. Em 2021, o ín- dice caiu para 10% e, no Projeto de Lei Orçamentária de 2023, a porcentagem desceu um pouco mais: passou para 9% dentro de um total de R$ 159 bilhões separados para o Ministério, ou seja, apenas R$ 14,8 bilhões.

Especialistas explicam que, por mais que o governo se defenda e diga que os repasses para a EPT estão su- bindo, o montante está muito abaixo do necessário: ele não é proporcional ao orçamento total nem às deman- das do segmento e não leva em conta questões como o aumento no número de alunos; a necessidade de cursos de reciclagem de professores; ampliação no atendimen- to estudantil; construção de novas salas e estruturas, entre outras.

Fonte: Itaú Educação e Trabalho, elaborado com dados do Ministério da Educação, com adaptações.

De acordo com o Itaú Educação e Trabalho, “insti- tuições da rede federal de Educação Profissional, Cien- tífica e Tecnológica receberão R$ 2,1 bilhões dos recur- sos do MEC em 2023 para custeio de operações, mas o Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) diz que o valor é insuficiente e não recompõe cortes e bloqueios dos últimos anos.

Outro ponto que surpreende pesquisadores é o fato de que a perda de espaço do ensino profissionalizante no orçamento do país ocorre no mesmo período de implan- tação do novo Ensino Médio, que teve início em 2022. Entre as mudanças do novo currículo, está a oferta de formação técnica e profissional, além da meta constan- te no Plano Nacional de Educação (PNE) de matricular cinco milhões de estudantes no ensino técnico profis- sionalizante até 2024.

O que é certo é que as escolas públicas de todo país terão de fazer um esforço adicional para implantar to- das as mudanças e adaptações para uma educação pro- fissionalizante com o mínimo de qualidade. Sem orça- mento, a situação fica cada vez mais delicada, para não dizer improvável. Atualmente, o setor conta apenas com o benefício do repasse do Fundo de Manutenção e De- senvolvimento da Educação Básica (Fundeb).

A falta de estímulo para o investimento no EPT não reflete a importância que a área tem para o Brasil. Ela é uma das principais apostas da indústria brasileira para retomar o crescimento econômico nacional de maneira contínua e gerar melhores oportunidades de emprego e renda para jovens e adultos. O estudo “Indicadores de qualidade do egresso do ensino técnico e profissionali- zante (2022)”, encomendado pelo Itaú Educação e Tra- balho e realizado com base nos dados do Instituto Bra- sileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelou que o ensino técnico abre mais portas de trabalho do que o ensino médio completo ou o ensino superior incomple-to.

BRASIL: PAÍS TEM ÍNDICE BAIXO NA FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS

A falta de investimento aplicado nas escolas técni- cas e profissionalizantes tem refletido diretamente na formação desse perfil de profissional no país. De acordo com a Organização para Cooperação e Desenvolvimen- to Econômico (OCDE), em 2021, o índice de estudan- tes brasileiros que concluíram o ensino técnico é baixo, se comparado aos padrões internacionais. Somente 9% dos alunos brasileiros obtiveram diploma na área, en- quanto os outros países pesquisados alcançaram média

de 38%. Alemanha e Suíça foram os países que mais se destacaram: dois terços dos estudantes obtiveram a di- plomação no campo técnico.

Órgãos ligados à educação profissional e técnica ga- rantem que não falta público interessado na área. Pes- quisa realizada em 2022 pela ONG Todos Pela Educação em parceria com a Fundação Telefônica Vivo, o Institu-to Natura e o Instituto Sonho Grande revelou que 98% dos estudantes das escolas públicas se dizem interessa-dos em instituições que os preparem para o mercado de trabalho. Já o Mapa do Trabalho Industrial 2019-2023, elaborado pelo Serviço Nacional de Aprendizagem In- dustrial (SENAI), garante que o Brasil necessitará quali- ficar 10,5 milhões de trabalhadores nos níveis superior, técnico, qualificação profissional e aperfeiçoamento até 2023. As áreas mais demandadas são metalmecânica, construção civil, logística e transporte.

A EPT é apontada como um caminho que abre por- tas para o jovem sair da fila dos desempregados e entrar para o rol dos que trabalham e, mais, dos que conse- guem aprimoramento de carreira. De acordo com o Ins- tituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), entre os 48,5 milhões de pessoas de 15 a 29 anos, 11 milhões não estudam nem trabalham. E o ensino técnico é uma al- ternativa palpável para alavancar as matrículas na edu- cação profissional e tecnológica em até 80%, saindo de 1,9 milhão para 3,4 milhões.

COMO MELHORAR A EPT NO BRASIL?

É uníssono entre estudiosos, pesquisadores e pro- fissionais que a Educação Profissional e Tecnológica é um segmento estratégico para impulsionar a produti- vidade, melhorar a economia, gerar vagas de trabalho, ampliar as oportunidades e aprimorar a qualificação dos jovens e futuros profissionais. Entretanto, é notório que o tratamento que o segmento tem recebido é despropor- cional à sua importância para o país. Diante de tantos impasses e desafios, qual seria a solução para melhorar a educação técnica?

Em primeiro lugar, segundo as instituições educa- cionais, a solução está no aumento dos investimentos para o setor na mesma (ou quase) proporção da verba destinada à educação e de acordo com as demandas de quem oferece o ensino. Em entrevista ao jornal Valor Econômico em fevereiro de 2023, o secretário-executivo do Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Co- nif), Alexandre Bahia, lembrou que o número de alunos matriculados na EPT aumentou em um milhão durante cinco anos, enquanto o orçamento não acompanhou tal ritmo:

Nós tínhamos um tamanho e hoje temos outro. Em 2015, tínhamos 500 mil estudantes e hoje te- mos 1,5 milhão de estudantes. E temos um orça- mento menor do que 2015. Como pode isso?

Em segundo lugar, a solução perpassa por com- preender a amplitude e importância da EPT para o Brasil e seus benefícios em termos de preparo do aluno para o mercado de trabalho. Quando não se valoriza o projeto, toda uma cadeia de atuação é atingida: empresas dei- xam de apoiar a educação técnica; interrompe-se a cons- trução de novas salas; ocorre a diminuição no número de visitas técnicas dos alunos às empresas, entre outros fatores. É necessário levar em consideração, ainda, os prejuízos de aprendizado para o aluno do curso técni- co, que muitas vezes está à frente de outros estudantes, mas, sem incentivo, dificilmente conseguirão avançar e se tornarem competitivos para o mercado de trabalho.

Estudo divulgado pelo Sistema de Avaliação da Edu- cação Básica (Saeb) em 2021, elaborado pela platafor- ma QEdu, afirma que os estudantes do ensino técnico profissionalizante têm desempenho melhor em relação aos que frequentaram o ensino médio regular. Em Lín- gua Portuguesa, por exemplo, 57% atingiram nível con- siderado adequado, em comparação com os 31,3% do ensino médio regular. Em Matemática, o desempenho dos alunos do ensino técnico foi de 17,9%, frente aos 5% do ensino regular. São sinais de que é preciso olhar para esses futuros profissionais com mais atenção.

O União Brasil está atento a esse cenário e às suas deficiências. Os representantes do partido no Congres- so Nacional são os principais defensores de mais opor- tunidades, mais renda, mais emprego e mais poder de escolha aos brasileiros. Isso perpassa, necessariamente, por apoiar a educação profissional e técnica.

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